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quarta-feira, 7 de julho de 2021

Agricultura Familiar - Parte 4 - Módulo Fiscal e a importância da Agricultura Familiar

Adilson D. Paschoal 

Professor Titular-Sênior da Esalq-USP 


Módulo fiscal e a propriedade rural

Módulo fiscal é uma unidade de medida introduzida pela Lei nº 6.746, de 10 de dezembro de 1979. O módulo fiscal de cada município, expresso em hectare, é determinado pelo Incra levando-se em conta os seguintes fatores: a) o tipo de exploração predominante no município (hortifrutigranjeira, cultura permanente, cultura temporária, pecuária, florestal); b) a renda obtida no tipo de exploração predominante; c) outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada; o conceito de propriedade familiar. 

O módulo fiscal alterou alguns itens do Estatuto da Terra (Lei nº 4.504, de 30/11/1964). Seu valor expressa a área mínima necessária para que uma unidade produtiva seja economicamente viável. O número de módulos fiscais de um imóvel é utilizado no cálculo do Imposto Territorial Rural (ITR). 

A Lei nº 8.629, de 25/2/1993, define pequena propriedade como sendo o imóvel rural de área compreendida entre 1 módulo e 4 módulos fiscais e média propriedade como sendo aquela de área superior a 4 e até 15 módulos fiscais. Área inferior a 1 módulo fiscal é minifúndio e área superior a 15 módulos fiscais é grande propriedade ou latifúndio. O tamanho de um módulo fiscal varia de acordo com a região e o município onde se localiza a propriedade. O valor do módulo fiscal no Brasil varia de 5 a 110 hectares. Exemplos: São Paulo, capital: 6 ha; Piracicaba, Campinas e Ribeirão Preto: 10 hectares; Cananeia; 16 ha; Botucatu: 20 ha; Auriflama (noroeste paulista): 35 ha. 

Dessa forma, no município de Piracicaba, áreas de 10 hectares (um módulo) a 40 hectares (quatro módulos) são consideradas pequenas propriedades, valores esses que expressam as áreas mínimas necessárias para que uma unidade produtiva seja economicamente viável. De acordo com a Lei nº 11.326, de 24 de julho de 2006, o tamanho máximo de uma propriedade desse município poder enquadrar-se na categoria de agricultura familiar é 40 hectares, i.e., quatro módulos fiscais. 

A área de agricultura familiar está atrelada, pois, ao conceito de módulo fiscal, não podendo, a qualquer título, ser maior do que 4 (quatro) módulos fiscais (Decreto no. 9.064, de 31/5/2017). No novo Código Florestal (Lei nº 12.651, de 25/5//2012, o valor do módulo fiscal é utilizado como parâmetro legal para a sua aplicação em diversos contextos, como na definição de benefícios atribuídos à pequena propriedade ou posse rural familiar; na definição de faixas mínimas para recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APP); da manutenção ou recomposição de Reserva Legal etc. 

Com base no conceito de pequena propriedade pode-se definir agricultura familiar como sendo a forma de produção que compreende o cultivo do solo e de outros meios, realizado por pequenos proprietários rurais em área máxima de quatro módulos fiscais, com mão de obra prior outros bens e serviços, e que resida no estabelecimento ou em local próximo a ele. Em termos mais amplos inclui atividades agrícola, florestal, pesqueira, pastoril e aquícola. 


Importância da agricultura familiar no mundo

Dados de 2014 da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) demonstram ser a agricultura familiar a que predomina no mundo atual, apesar do grande avanço da agricultura industrial. Das 570 milhões de fazendas do mundo 500 milhões são de agricultura familiar (87,7%), assim distribuídas: Ásia 85%; América do Norte e Central 83%; Europa 68%; África 62% e América do Sul 18%. A agricultura familiar é responsável por pelo menos 56% de toda a produção mundial agrícola, florestal, pesqueira, pastoril e aquícola. Nos Estados Unidos, as fazendas familiares geram 84% de toda a produção norte-americana, totalizando 230 bilhões de dólares, ocupando 78% das propriedades do país. No Brasil, a agricultura familiar responde por 40% da produção nacional das principais culturas, em 25% das propriedades. Agricultores familiares são os principais produtores de arroz, especialmente na Ásia. Mais de 3,5 bilhões de pessoas dependem desse cereal para prover pelo menos 20% de suas necessidades calóricas diárias. 

Segundo a FAO, nos países em desenvolvimento da África, Ásia e América Latina os pequenos agricultores são em geral pobres, sendo para eles recomendadas as técnicas sustentáveis e acessíveis da Agroecologia. Para muitas culturas, fazer-se agricultura em grandes áreas requer mão de obra contratada que, por sua vez, requer supervisão, cujo custo pode ser maior do que os benefícios obtidos, razão pela qual a agricultura familiar se torna mais vantajosa. As propriedades familiares são normalmente pequenas nos países em desenvolvimento (o custo da supervisão é fator limitante), empregando maior número de pessoas por hectare, que, por serem da mesma família, trabalham com maior afinco, garantindo maior produtividade do que as propriedades maiores; seu custo operacional é menor e o capital é aplicado em área menor. Nos países desenvolvidos, por outro lado, as Agricultores familiares do Sertão vivem a “seca do chão rachado” Brasil está entre os dez maiores produtores de caju do mundo fazendas familiares podem ser relativamente maiores, de custos menores, o capital podendo ser aplicado em áreas maiores. Na América Latina, assim como no Leste Europeu, a agricultura familiar coexiste com grandes fazendas de monoculturas para exportação. 


Importância da agricultura familiar no Brasil

Estudos conduzidos pela Embrapa mostram ser a agricultura familiar brasileira extremamente heterogênea, com muitos agricultores vivendo em condições de extrema pobreza, praticando agricultura de subsistência, e outros bem sucedidos, praticando agricultura de produção destinada ao mercado, tanto o convencional do agronegócio como o orgânico da agroecologia. Tais diferenças gritantes têm sua origem em muitos fatores, alguns históricos e outros regionais, culturais, políticos, econômicos e sociais. 

 A propriedade agrícola familiar é gerida pela própria família, sendo uma firma em que o produtor usa a terra como fonte de renda e de subsistência como de moradia. Por produzir alimentos e outros produtos para si e para venda as propriedades familiares são diversificadas, conseguindo com isso maior estabilidade financeira e ecológica. A venda dos produtos in natura ou processados (agroindústria familiar artesanal) ocorre diretamente na propriedade, em feiras livres e orgânicas, em cooperativas, em mercados municipais e em redes de mercado e supermercado. Tal modelo de agricultura relaciona-se diretamente com a segurança alimentar e nutricional das pessoas, impulsionando a economia local. Com a urbanização do meio rural, novos nichos de mercado têm surgido como ecoturismo, lazer, pesque e pague, criação de animais e plantas exóticos, viveiro de mudas etc. É o que vem sido chamado de Novo Rural, embora seja secular a agricultura não patronal. 



 Assim como acontece em todo o mundo, a agricultura familiar brasileira é responsável pela maior parte dos alimentos destinados ao consumo interno da população. O Censo Agropecuário de 2006 informa que: 84,4% das propriedades rurais são de base familiar e ocupam 74,4% da mão de obra do campo, compreendendo apenas 24,3% de toda a área rural do país; ser de R$ 54 bilhões (38%) a participação da agricultura familiar no valor bruto da produção nacional e de R$ 89 bilhões (62%) a participação da agricultura não familiar; a distribuição do número de estabelecimentos familiares por região indica o Nordeste como sendo o de maior número (50%), seguido pelo Sul (19%), Sudeste (16%), Norte (10%) e Centro-Oeste (5%); a distribuição da área dos estabelecimentos por região indica o Nordeste como sendo o de maior área (35%), seguido pelo Norte (21%), Sul e Sudeste (16% cada) e Centro-Oeste (12%); ser a seguinte a produção de alimentos da agricultura familiar quanto à porcentagem do total produzido: mandioca (87%); feijão (70%); suínos (58%); leite (57%); aves (50%); milho (46%); café (38%); arroz (34%); bovinos (30%); trigo (21%); soja (17%). Além desses alimentos há vários outros provenientes de hortas, pomares, criações de caprinos, ovinos, gado de corte e abelhas. 

Segundo o Censo Agropecuário do IBGE de 2017, feito em mais de 5 milhões de propriedades rurais, 77% dos estabelecimentos agrícolas do país pertencem à agricultura familiar (cerca de 3,9 milhões de estabelecimentos). Em extensão de área, ela ocupa 80,9 milhões de hectares, ou seja, 23% da área total dos estabelecimentos, empregando mais de 10 milhões de pessoas (67% do total) e sendo responsável por 23% do valor total da produção do setor agropecuário (R$107 bilhões). Do pessoal ocupado com agropecuária familiar o Nordeste aparece em primeiro (46.6%), seguido pelo Sudeste (16,5%), Sul (16%), Norte (15,4%) e Centro-Oeste (5,5%). Do valor total da produção, a maior parte provém do Sul, seguido pelo Norte, Nordeste, Sudeste e Centro-Oeste. Os agricultores familiares destacam-se na produção de culturas permanentes, com 48% do valor da produção de café e banana; nas culturas temporárias, são responsáveis por 80% do valor de produção de mandioca, 69% de abacaxi e 42% de feijão. 


Nota: No próximo artigo é descrita a agricultura familiar nas regiões Nordeste e Sudeste. 


Referência: 

PASCHOAL, A.D. História Ilustrada da Agricultura. Seis séculos de agricultura no Brasil. 

Edição comemorativa dos 120 anos da Esalq e dos 200 anos da Independência do Brasil. 550 p. aprox. Em revisão, para publicação. 


 


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