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sexta-feira, 31 de maio de 2019

Aspectos Históricos da Agricultura Paulista: Parte 25. O empreendedor e empresário Luiz de Queiroz, sua fábrica de tecidos de algodão, telefonia e iluminação elétrica.

Adilson D. Paschoal
Professor Sênior da Esalq-USP

Séculos XIX e XX. Com o algodão inicia-se a Revolução Industrial. Krähenbühl, Engelberg, Luiz de Queiroz e Barão de Resende: pioneiros da industrialização. O Salto do rio Piracicaba e a ideia de utilização de sua força hidráulica. Fábrica de Tecidos “Santa Francisca”. O enigma do telefone. Usina Elétrica.


Colheita e beneficiamento de algodão. Tela de Oscar Pereira da Silva Esalq, 1916.

Figura marcante em Piracicaba, nas últimas décadas do século XIX, era Luiz Vicente de Souza Queiroz. Ele havia aprendido muito com as viagens empreendidas e com os estudos realizados no exterior, não apenas na área agrícola, mas em outras também, ligadas à mecanização e ao processo industrial do Velho Continente. Durante sua permanência na Europa, de 1857 a 1873, grandes descobertas estavam sendo feitas. Assim, em 1867 o engenheiro francês Aristides Berges aproveitou pela primeira vez a força hidráulica para gerar energia elétrica, instalando, numa serraria de sua propriedade, a primeira turbina movida por queda d’água. Antes, porém, na Inglaterra iniciava-se a Revolução Industrial, com a mecanização das tecelagens que utilizavam algodão como matéria-prima. O processo manual cede lugar às máquinas, impulsionadas por força hidráulica, e estas às máquinas a vapor, depois substituídas pelos maquinários elétricos. Em 1842, o tear torna-se semiautomático, automatizando-se completamente em 1890. 

A industrialização no Brasil também se inicia com as fábricas de tecidos. Havia, porém, sério impedimento: a Inglaterra, através de um tratado com Portugal, impedia que os tecidos brasileiros competissem com os tecidos ingleses. Somente uma mudança política alteraria tal restrição.

Da sede da fazenda em que Luiz de Queiroz se hospedara em 1873 (Fazenda Nazareth), pertencente aos seus tios, os marqueses de Valença, a vista do salto do rio Piracicaba, ao longe, era esplêndida, já que a sede ficava em terreno elevado, distante da margem do rio. — Por que não utilizar de suas águas para iniciar uma revolução industrial em Piracicaba? Mas por onde começar? — conjetura ele. A
fazenda produzia café, mas o que mais lhe chamou a atenção foi o algodão, que o Barão de Serra Negra havia introduzido regionalmente. Força das águas e o ouro branco: era tudo o que ele precisava para iniciar algo que ninguém, na cidade, jamais pensara. Montaria uma fábrica de tecelagem de algodão.

Mas como tudo aquilo que é novidade, pioneiro, é contraposto pelos mais velhos e conservadores, por força de experiência, tradicionalismo, hierarquia ou temeridade, à ideia a que ele propunha levar adiante mil obstáculos foram colocados, que só serviram para acalentar ainda mais a sua determinação de jovem dinâmico e inovador, de jamais esmorecer face às adversidades. Afinal, seus conhecimentos
adquiridos no exterior eram garantia de sucesso, de inovar naquilo que seus conterrâneos desconheciam.

Ao contrário da agricultura, cujas fazendas eram de posse quase que exclusiva de portugueses e de seus descendentes brasileiros, conduzidas não por eles, mas por escravos, a indústria tinha principalmente nos imigrantes seus grandes iniciadores e proprietários. Primeiro foram alemães e suíços, depois ingleses, americanos e italianos. Em São Paulo, o café foi a principal cultura que levou à industrialização. As fábricas de máquinas para a lavoura, para trabalhar o solo, beneficiar e ventilar café, e para a indústria, assim como as fundições e oficinas mecânicas concentravam-se principalmente em São Paulo, Pindamonhangaba, Campinas e Rio Claro. Tecelagens mecanizadas já existiam na capital e em Sorocaba.

Uma única iniciativa de industrialização expressiva existia em Piracicaba: a Oficina Krähenbühl, fundada pelo suíço Pedro Krähenbühl em 1870, com fábrica de troles, tílburis, charretes, carroças, carroções, jardineiras e carros fúnebres, veículos esses que substituíram os carros de bois. A fábrica de Luiz de Queiroz seria a segunda (1876). Outras viriam logo depois. Assim, em 1882 o Barão de Resende, primo de Luiz de Queiroz, inaugura o Engenho Central, com maquinário moderno importado da França. O piracicabano Evaristo Conrado Engelberg, filho de imigrantes alemães, inventa a máquina de beneficiar arroz (depois adaptada para descaroçar café) e o ventilador para café coco. Tais máquinas, que revolucionaram o processamento de grãos, eram produzidas em Piracicaba desde 1885 e vendidas em São Paulo pela Engelberg, Siciliano & Cia, no bairro dos Campos Elíseos.

Na margem esquerda do rio Piracicaba, em terras que lhe pertenciam (parte da Fazenda Engenho d’Água), Luiz de Queiroz instala a Fábrica de Tecidos “Santa Francisca”, nome com o qual homenageava sua mãe, a Baronesa de Limeira. A empresa fora fundada em 1873, com pedido de concessão para instalar uma usina de força no rio Piracicaba. Com equipamentos importados da Inglaterra e com técnicos vindos da Bélgica, as obras começam em 1° de julho de 1874, com o lançamento da pedra fundamental, sendo os trabalhos conduzidos pelo engenheiro mecânico inglês Arthur Drysdem Sterry. Pela ausência de carpintaria, as obras em madeira foram entalhadas a mão. Sendo a fábrica dotada de máquinas para fiar e tecer algodão, e sendo a cultura do algodoeiro pequena na região, dominada pela cana e pelo café, Luiz de Queiroz inicia o plantio da malvácea em sua propriedade e incentiva o cultivo em outras, que passam a lhe fornecer a matéria-prima, vinda de
Santa Bárbara do Oeste, Sorocaba, Tietê e Tatui. Os fornecedores recebiam 2$000 por arroba de algodão bruto. Seus estudos de agricultura permitiram que empregasse tecnologias avançadas, trazidas da Europa, do Egito e dos Estados Unidos.

Em 1876, a fábrica estava pronta, passando a produzir 2.400 metros de tecido por dia, com cinquenta teares e 2.500 fusos em funcionamento e o trabalho de setenta operários, todos livres, para os quais catorze casas foram construídas, além de outra para o guarda-livros (contador). Toda a produção era enviada para São Paulo, Rio de Janeiro e Paraná, utilizando, a partir de 1877, os trilhos da Cia. Ituana
e a navegação fluvial nos rios Piracicaba e Tietê. Em pouco tempo, acumula grande riqueza, que o impele a novos investimentos.


Planta da cidade de Piracicaba de 1916, onde as indústrias pioneiras aparecem ao longo do rio Piracicaba: Empresa Hidráulica (1), Usina Elétrica (2), Fábrica de Tecidos “Santa Francisca” (Arethusina) (3), Engenho Central (margem direita). O Palacete de Luiz de Queiroz aparece do lado esquerdo da fábrica de tecidos. Fonte: Ravache, H. Planta da cidade de Piracicaba, 1916. Arquivo do Museu Prudente de Moraes.

A fábrica era constituída por vários prédios, de funções variadas, tendo arquitetura simples, o maior deles sendo o grande pavilhão da tecelagem, dividido em quatro blocos em desnível, o que exigiu porões. Um casarão coberto com telhas coloniais, antiga sede da fazenda Engenho d’Água, abriga o escritório. Entre o pavilhão e a casa sede um jardim francês foi construído, ladeando um canal, com ponte para a travessia. Um frontão, com a epígrafe da empresa, destaca-se na fachada. O fornecimento de água operava por caixa d’água, abastecida por dutos. No terreno mais acidentado, ao lado da fábrica, uma cocheira abriga alguns animais e carroças, com pastos cercados com tábuas.


Na margem esquerda do rio Piracicaba, em terras que lhe pertenciam (parte da Fazenda Engenho d’Água), Luiz de Queiroz instala a Fábrica de Tecidos “Santa Francisca”. A fábrica era constituída por vários prédios, o maior deles sendo o grande pavilhão da tecelagem, dividido em quatro blocos em desnível. Um casarão, antiga sede da fazenda, abrigava o escritório. Fábrica de Tecidos “Santa Francisca” (Erethusina). Acervo do IHGP, Piracicaba.


A par de tudo o que de mais moderno havia na Europa, nos Estados Unidos e nas principais cidades do país, Luiz de Queiroz introduz em sua fábrica algo que o mundo pouco conhecia: o telefone. Inventado em 1860 pelo italiano Antônio Meucci, teve em Chicago, EUA, sua primeira linha, operada por uma central telefônica em 1876; a segunda foi instalada no Rio de Janeiro, em 1877, a mando de Dom Pedro II; a terceira foi em Campinas, esta de origem incerta. Pelas pesquisas que fiz, a linha operava em um galpão da fazenda Santa Genebra (Campinas, distrito de Barão Geraldo), uma imensidão de terra (1.250 alqueires) cultivada com café, pertencente, desde 1876, a Geraldo Ribeiro de Souza Resende (Barão de Geraldo Resende), engenheiro agrícola formado na França, tornando-se fazenda modelo, produzindo e beneficiando café com tecnologias avançadas para a época.

O fato de Geraldo ser primo de Luiz de Queiroz e de ter estudado agricultura na França, sendo apenas três anos mais velho que ele, levou à falsa interpretação de que Luiz de Queiroz teria instalado uma linha telefônica na “sua fazenda Santa Genebra” (Kiehl, 1976) quando, na realidade, o telefone foi instalado na sua fazenda Engenho d’Água, ou mais propriamente, na sede desta fazenda em Piracicaba, ligando-a com a Fábrica “Santa Francisca” e com o palacete que construía ao lado, situados há pequena distância dela (Ver observação). As terras da fazenda Engenho d’Água estendiam-se de Piracicaba a Limeira. No dia 22 de novembro de 1882, o jornal A Gazeta notificava a existência de telefone em postes e fios na propriedade de Luiz de Queiroz, e que não havia telefones públicos em Piracicaba.

O ano era 1873, quando os postes das principais esquinas de Constituição (Piracicaba) passaram a iluminar a cidade com querosene. Em 1879, nos Estados Unidos, Thomas Alva Edison inventa a lâmpada elétrica. Três anos depois, ele iluminava, com sua invenção, a Pear Street, em Nova Iorque. No ano seguinte (1880) a mesma tecnologia era usada em Campos, no Rio de Janeiro, gerando eletricidade uma usina movida a vapor produzido pela queima de carvão. Em Sorocaba, no bairro Votorantim, havia a Fábrica de Tecidos Votorantim, onde se instalou uma das primeiras usinas hidrelétrica de São Paulo e uma usina térmica (1889) para fornecer energia à tecelagem.

Conhecedor desses progressos, pois viajava com frequência ao Rio de Janeiro, onde tinha parentes, e sabedor do alto custo do carvão para gerar eletricidade, não dispondo o país de reservas do combustível, Luiz de Queiroz resolve instalar uma usina hidrelétrica em sua propriedade, não só para acionar as máquinas da fábrica e iluminá-la, como para fornecer eletricidade para a cidade.


Luiz de Queiroz resolve instalar uma usina hidrelétrica em sua propriedade, às margens do rio Piracicaba, inaugurada por ele em 1893, sendo ela a primeira de seu gênero na cidade. Usina Elétrica (1893), com o seu criador (de branco, no primeiro plano). Acervo da Esalq.

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Observação. A fazenda Santa Genebra (1.250 alqueires), equivocadamente citada como pertencente a Luiz de Queiroz, local onde ele teria instalado telefone e plantado algodão para a sua fábrica de tecidos (Kiehl, 1976), ficava em Campinas, sendo proprietário um de seus primos (Geraldo Ribeiro de Souza Resende, Barão Geraldo de Resende), engenheiro agrícola formado na França. Geraldo adquiriu a fazenda em 1876, após a morte de sua mãe Ilídia Mafalda de Souza Queiroz, casada com Estevão Ribeiro de Resende (Marquês de Valença, falecido em 1856) que a havia comprado em 1850, após a morte de uma das filhas de Francisco Antônio de Souza Queiroz (Barão de Souza Queiroz), que a herdara do pai. A fazenda foi, originalmente, propriedade do Brigadeiro Luiz Antônio de Souza Queiroz, que a nomeou Fazenda Santa Genebra em homenagem a sua esposa Genebra de Barros Leite.

No inicio do século XX, a fazenda tornou-se a maior produtora de café do estado de São Paulo, usando tecnologias avançadas no campo, no terreiro de secagem e no beneficiamento dos grãos; para o escoamento da safra, dispunha de ferrovia própria. Geraldo, assim que adquiriu a fazenda, alforriou todos os escravos e contratou mão de obra europeia. A fazenda tinha telefone, que foi um dos primeiros da cidade, senão o primeiro. Algodão só foi plantado na fazenda por ocasião da crise do café, nos anos 30 do século XX (Ver ilustrações na página 7). A fazenda Santa Genebra deu origem ao bairro Barão Geraldo, em Campinas.

A Usina Elétrica, às margens do rio Piracicaba, foi inaugurada por Luiz de Queiroz em 1893, sendo ela a primeira de seu gênero na cidade.

Antes de seu casamento, em 1880, com dona Ermelinda Ottoni de Souza Queiroz, filha do Conselheiro Cristiano Ottoni, Luiz de Queiroz manda construir um palacete ao lado da fábrica, que tomava todo um quarteirão, sendo cercado por muros, contendo belos jardins e sombreador arvoredo. Nele passou a viver com a esposa, tendo sido a residência uma das que primeiro recebeu luz elétrica no país.


O palacete que Luiz de Queiroz erigira ao lado da fábrica, para viver com sua esposa Ermelinda Ottoni, recebeu luz elétrica, tendo sido a residência uma das primeiras a receber este benefício no país. Fotos de autor desconhecido.

Desde que adquirira a fazenda São João da Montanha, em 1889, suas atividades na fábrica são reduzidas, passando ele a concentrar-se na escola agrícola, cujas obras iniciara. Problemas logo surgem. Torna-se impossível para ele custear sozinho a escola e a iluminação pública da cidade; o governo não lhe vem no auxílio.

Desgostoso, Luiz de Queiroz decide vender a fábrica de tecidos, que estava fechada há dois anos, e o palacete onde morava com a esposa. Os imóveis são adquiridos por um sindicato. Postos como garantia para pagamento de divida junto ao Banco da República do Brasil, em 1897, e não tendo o sindicato honrado o compromisso, os imóveis acabam vendidos pelo banco, em 1902, para Rodolpho Nogueira da Rocha Miranda, filho do Barão de Bananal, ocasião em que a fábrica passa a se chamar Arethusina, em homenagem à sua esposa Arethusa. Ampliada e remodelada, a fábrica de tecidos estava entre as 21 maiores empresas industriais paulistas em 1907, com capital de 1.800 contos de réis, tendo 300 operários. Em 1918, é vendida para a companhia inglesa Boyes.

Continua.

Referências

CACHIONI. M. O papel pioneiro de Piracicaba na construção fabril na província de
São Paulo. Doutorando, FAU, USP, sd.

KIEHL, E. J. Vida e obra de Luiz de Queiroz. Esalq 75. Livro comemorativo do 75º.
aniversário da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”. 1976, pag. 21-40.

MAGIOLI, L. Fábrica de tecidos “Boyes”. Memorial do Empreendedorismo. Acipi,

2014.

MARSON, M. D. Origens dos empresários da indústria de máquinas e equipamentos
em São Paulo, 1870-1900. Nova econ. vol.22 no.3 Belo Horizonte Sept./Dec. 2012

NETTO, C.E. A secular fábrica. A fábrica de tecidos que foi Santa Francisca, depois
Erethusina. Memorial de Piracicaba, Almanaque, 2000.

PASCHOAL, A.D. História de uma família. Genealogia à luz da história. Tomo II.

Séculos XIX e XX. 403 p. Piracicaba, 2010.


Fazenda Santa Genebra em 1880, com sua monumental casa sede, terreiro de café mecanizado e outras benfeitorias, já com mão de obra livre. Foto de autor desconhecido.


Fazenda Santa Genebra, onde aparece a família do Barão de Geraldo Resende. Litografia do desenhista paulista Henrique Manzo.


Aspectos Históricos da Agricultura Paulista: Parte 24. Luiz Vicente de Souza Queiroz: Ancestralidade e formação profissional.

Adilson D. Paschoal
Professor Sênior da Esalq-USP

Séculos XIX e XX. O ensino precário de São Paulo. Com a aristocracia cafeeira moderniza-se a capital paulista. O Barão de Limeira manda o filho Luiz de Queiroz estudar na Europa. Instituições cursadas. Retorno ao Brasil e a vinda para Piracicaba. Na fazenda dos Marqueses de Valença. 


Era comum às famílias mais abastadas, enriquecidas em função do café e do açúcar, enviar para estudar na Europa os filhos varões, suprindo, dessa maneira, a quase ausência de escolas na província de São Paulo, bem como a ineficiência ou inconstância do ensino naquelas existentes. Tentativas iniciais, implantadas desde a vinda da família real portuguesa para o Brasil em 1808, falharam quase que completamente. A mais antiga instituição paulista, e de todo o Brasil, data de 1827, quando o imperador D. Pedro I criou o Curso de Ciências Jurídicas e Sociais, instalado no Convento de São Francisco, em São Paulo (atual Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, USP); simultaneamente, criou ele idêntico curso em Olinda, instalado na Basílica e Mosteiro de São Bento. Em 1834, tentou-se aprimorar a educação, ficando os ensinos primário, secundário e de formação de professores sob a responsabilidade das províncias, colégios, liceus e escolas normais sendo criados principalmente por iniciativa privada. Tal foi o que ocorreu na cidade de São Paulo com a criação do Liceu Coração de Jesus (1885, salesiano) e com a Escola Normal “Caetano de Campos” (1846), só para homens, esta de um único professor para todas as matérias, ora aberta, ora fechada, em um lugar, depois em outro. O primeiro colégio criado no Brasil foi o Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro, em 1837, por meio de um decreto imperial. Referente ao ensino secundário, “Pedro II” era tido como padrão para o Brasil, servindo de modelo de educação de qualidade para os colégios privados. Já o ensino superior era de atribuição exclusiva do poder central. 

Na província paulista, alguns colégios, de orientação religiosa e de caráter privativo, foram criados no século XIX: Colégio São Luis (1867, jesuítico), em Itu, transferido depois para São Paulo em 1919; Colégio Internacional (1869, presbiteriano), em Campinas; Colégio Mackenzie (1870, presbiteriano) e Deutsche Schule (1878, depois Colégio “Visconde de Porto Seguro”, de orientação germânica), ambos em São Paulo; e Colégio Piracicabano (1881, metodista), em Piracicaba. Nas primeiras décadas do século XX, alguns liceus, como o Liceu Nacional “Rio Branco”, de iniciativa particular, surgem em São Paulo para atender, principalmente, os filhos de fazendeiros e de famílias tradicionais paulistanas.

A educação considerava-se ser exclusiva dos ricos, sendo possível apenas em algumas das principais cidades do Império, e para pouquíssimos alunos; algumas escolas, e.g. as salesianas, aceitavam apenas meninos. Houve tempo em que a carência de professores obrigava a que alunos mais aplicados, indicados por seus mestres, passassem a ensinar os colegas mais atrasados, perpetuando-se o analfabetismo e o ensino de baixa qualidade. Aos escravos proibia-se o estudo em escolas, impedindo, assim, o acesso deles ao conhecimento.

A cidade de São Paulo, provinciana por centenas de anos, de numerosas chácaras de agricultura diversificada, começa a se urbanizar a partir dos anos 70 do século XIX, surgindo bairros bem planejados, por exímios engenheiros estrangeiros, graças ao advento das estradas de ferro, que, de 1867 em diante, passaram a ligar a capital paulista ao porto de Santos, ao Rio de Janeiro, ao Oeste Velho e ao Oeste Novo. Surgem, em consequência, os primeiros bairros organizados, para onde a aristocracia cafeeira, de barões, viscondes, condes e marqueses, passou a morar, em confortáveis mansões, palacetes, casarões e sobrados, construídos para abrigar suas numerosas famílias e serviçais. Nas suntuosas residências, construídas com muitos materiais importados da Europa e dos Estados Unidos, imperava o luxo e a extravagância, tornada moda a exibição, em armários abertos e em outros móveis, de pratarias, louças inglesas, cristais, até mesmo máquinas de escrever, recentemente aperfeiçoadas.

O primeiro deles foi o bairro Campos Elíseos, projetado em 1878 por empresários suíços e alemães, e onde, de 1890 a 1899, o cafeicultor e político Elias Antônio Pacheco Chaves construiu o suntuoso Palacete Elias Chaves (depois Palácio dos Campos Elíseos, sede do governo paulista) para servir de morada para si e sua família. A obra foi inspirada em castelo renascentista francês, marco inicial da transformação da arquitetura paulistana, então voltada para o estilo europeu. Pela proximidade com duas importantes estações ferroviárias, a estação da Sorocabana (hoje Júlio Prestes) e a Estação da Luz, o bairro era local de embarque e desembarque dos fazendeiros que vinham a negócio a São Paulo, transformando-se em local preferido por eles para a construção de suas luxuosas mansões, a primeira das quais foi a do Barão de Piracicaba (Antônio Paes de Barros), o primeiro a introduzir a cultura do café na província de São Paulo, em 1810.

O segundo local escolhido pela aristocracia cafeeira foi a Avenida Paulista, inaugurada em 1891, em terreno de antigas fazendas, chácaras e terras devolutas, projetada por um engenheiro agrícola uruguaio formado na Alemanha.

O projeto da avenida preconizava que seria plana, com cerca de três quilômetros de comprimento por doze metros de largura, havendo uma parte central para carruagens, cabriolés e tílburis, e duas laterais, uma para bondes puxados por burros e outra para cavaleiros. O leito carroçável era de pedregulhos brancos. Calçadas para pedestres existiam em ambos os lados. A nova avenida encheu-se rapidamente de palacetes e de belas mansões.

Morando na capital da província, sua terra natal, sem opção de escola adequada onde matricular os filhos, o Barão de Limeira decide por enviá-los à Europa. Assim foi com o menino Luiz Vicente de Souza Queiroz, nascido em São Paulo em 12 de julho de 1849, filho de Vicente de Souza Queiroz (Barão de Limeira) e de Francisca de Paula Souza e Mello, neto do português Luiz Antônio de Souza Queiroz (Brigadeiro Luiz Antônio) e de Genebra de Barros Leite, avós paternos que Luiz não conheceu por ter o avô falecido em 1819 e a avó em 1836.

O segundo local escolhido pela aristocracia cafeeira foi a Avenida Paulista, inaugurada em 1891, em terreno de antigas fazendas e terras devolutas, projetada por um engenheiro agrícola uruguaio formado na Alemanha. Avenida Paulista no dia da sua inauguração, em 1891. Aquarela de Jules Martin.


Em 1857, com a idade escolar de oito anos, Luiz de Queiroz segue para a Europa, acompanhado do irmão Francisco Vicente, pouco mais velho que ele, para iniciar estudos (Ver observação 1).

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Observação 1. Não há referência, de meu conhecimento, que mostre onde Luiz de Queiroz estudou em sua infância. O país mais provável é a França, pela grande importância que tinha na época, o francês sendo considerado língua universal, com a qual os nobres e as pessoas mais letradas no Brasil (que eram pouquíssimas), como os mestres-escolas, e ricas, como os aristocratas do ciclo do café, usavam para se comunicar e se instruir, vindo as principais obras literárias que aqui chegavam escritas nesse idioma ou para ele vertidas. Desde a criação do Colégio Pedro II (1837), o ensino do francês tornou-se obrigatório nas escolas públicas brasileiras, gradativamente substituindo o latim e o grego; franceses costumavam dar lições dessa língua em casa de pessoas ricas; a língua portuguesa não era ensinada, exceto para alfabetizar. A cidade mais provável de seus estudos, elementar e secundário, é Paris, a capital do século XIX, para onde também vinham, a estudo, pessoas que buscavam formação e aprimoramento, e, a passeio, com suas famílias, com relativa frequência, os fazendeiros paulistas mais abastados.

A instrução primária na França deixou de ser gratuita em 1850 (lei Falloux), predominando a educação religiosa. Provavelmente cursando a escola elementar (ècole élémentaire) de 1857 a 1860, o colégio (collège) de 1861 a 1864, e o liceu (licée) de 1865 a 1867, Luiz de Queiroz teria completado sua formação primária e secundária em 1867, com idade de 18 anos, estando, assim, apto para o ingresso na academia (ensino superior), pois o objetivo primordial do colégio e do liceu era o preparo do aluno para seguir carreira profissional.

Na adolescência, Luiz de Queiroz cursa a École d'agriculture de Grignon (Escola Nacional de Agricultura de Grignon), a mais próxima de Paris, de que distava cerca de 200 km, sendo ela a mais antiga da França, criada pelo rei Carlos X em 1826, com o nome de Escola Imperial de Agricultura, que funcionava no velho castelo de Grignon, edificado em 1636. Atualmente, a instituição chama-se Escola Nacional Superior de Agronomia, ligada ao Instituto das Ciências Industriais do Vivo e do Ambiente (AgroParisTech). Em Grignon, ele teria recebido o título de engenheiro agrícola, embora não haja documentação comprobatória disso (Ver observação 2).

École d'agriculture de Grignon, a mais antiga da França (1826), onde Luiz de Queiroz estudou e teria obtido o título de engenheiro agrícola. Château de Grignon, 2010. Foto de autor desconhecido (Wikipedia).
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Observação 2. Até 1892, época em que Luiz de Queiroz estava na Europa (de 1857 a 1873), havia três escolas nacionais de agricultura na França: Grignon, Montpellier e Grand-Jouan (depois Rennes). Todas emitiam diploma de engenheiro agrícola. A partir de 1960, com a reforma do ensino agrícola superior, o diploma de engenheiro agrícola foi suprimido. A Escola Nacional de Agricultura de Grignon passa a ser Escola Nacional Superior de Agronomia de Grignon, conferindo diploma de engenheiro agrônomo.

Admitindo-se que Luiz de Queiroz tivesse concluído sua formação primária em 1860 e secundária em 1867 (Ver observação 1), ele possivelmente cursou a Escola Nacional de Agricultura de Grignon de 1868 a 1869, pois era de dois anos a duração do curso de agricultura, o ensino sendo modificado em 1867, depois de haver redução do tamanho da fazenda modelo — base do ensino prático —, priorizando-se, desde então, o ensino teórico. A partir de 1872, a escola passou a ter duração de dois anos e meio (Delfour, 2000), quando também se iniciaram pesquisas e publicações de trabalhos, deixando a instituição de ser mera fazenda modelo. Para ingresso, necessário era passar-se em exame de admissão, e para concluir o curso, passar-se no exame de conclusão, quando então o estudante recebia diploma de engenheiro agrícola (que deixa de existir a partir de 1877).

Com a Guerra Franco-Prussiana, entre o Império Francês e o Reino da Prússia (Alemanha), iniciada em julho de 1870, e que se estenderia até maio de 1871, sendo a França invadida pelos prussianos, inclusive Paris, o pai de Luiz de Queiroz ordena que ele e seu irmão Francisco Vicente voltem para o Brasil (Ver observação 3).

Além de Grignon, Luiz de Queiroz deve ter cursado o Eidgenössische polytechnische Schule Zürich (Escola Politecnica Federal de Zurique), em Zurique, Suiça alemã, antiga instituição fundada em 7 de fevereiro de 1855, pela Confederação Suíça (Ver observação 4).


Eidgenössische polytechnische Schule Zürich (Escola Politecnica Federal de Zurique), em Zurique, Suiça, antiga instituição fundada 1855. Edifício Polytechnikum em 1865. Autor desconhecido (Wikipedia).

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Observação 3. A afirmativa de que Luiz de Queiroz teria voltado ao Brasil, por ordem de seu pai e pelo motivo da Guerra Franco-Prussiana de 1870, “interrompendo os estudos”, como afirma Queiroz (2003, 2007), não havendo documentos comprobatórios de que tenha concluído o curso, como afirma Marcovitch (2005) em seus dizeres: “Seu nome não foi encontrado nos arquivos dessas duas escolas (“Escola de Agricultura e Veterinária de Grignon, na França, e na de Zurique, na suíça alemã) é bastante contraditória. Cabem, aqui, as seguintes considerações. No “Álbum da Família Souza Queiroz” (Queiroz, 2007), o próprio autor afirma ter Luiz de Queiroz “retornado ao Brasil com 24 anos, em 1873”. Duas hipóteses são possíveis: uma, de que ele teria regressado ao Brasil em 1870, ano em que cursava o último ano da Escola de Grignon (dai a afirmativa “interrompendo os estudos”, e ao contrário do que postulei, de que ele possivelmente teria obtido o título de engenheiro agrícola em 1869); outra, de que ele teria regressado ao Brasil por ocasião do conflito e, com o fim deste, em 1871, retornado à Europa para concluir o curso de agricultura ou para cursar outro, em Zurique. Para um jovem rico, viagens ao Brasil, para rever os pais e os parentes, deviam ser comuns, daí, talvez, resultando confusas as afirmações emanadas dentro da própria família.

O que me parece mais provável é Luiz de Queiroz ter deixado a França durante o conflito com a Prússia (com ou sem o título de engenheiro agrícola) e mudado para um país neutro, a Suíça, só voltando definitivamente para o Brasil em 1873, após a morte do pai, ocorrida em 1872. Marcovitch (2005) diz em seu livro: “... Luiz de Queiroz foi mandado para a Europa, lá ficando por dezesseis anos seguidos”. Sua fluência em alemão, também sugere sua estada na parte alemã da Suíça.

A Escola Politécnica era inicialmente integrada por seis faculdades: arquitetura, engenharia civil, engenharia mecânica, química, silvicultura e um departamento para as áreas de matemática, ciências naturais, literatura e ciências políticas e sociais; visava formar engenheiros e cientistas. 

Com a morte de seu pai (com idade de 59 anos), em setembro de 1872, ocorrida em Baependi, MG, Luiz de Queiroz volta para o Brasil no ano seguinte, com a finalidade de tomar posse da fazenda Engenho d’Água, que lhe coube por herança, cujas terras iam de Constituição (Piracicaba) à Limeira. Tinha ele 24 anos de idade. 

A família Souza Queiroz, de grandes produtores de café, tinha em Francisco Antônio de Souza Queiroz (Barão de Souza Queiroz) e em seu irmão Vicente de Souza Queiroz (Barão de Limeira), filhos do Brigadeiro Luiz Antonio de Souza Queiroz, grandes proprietários de terras no interior paulista, em Campinas, Piracicaba, Limeira, Jaboticabal, Pirassununga, Descalvado, Mogi Mirim e Porto feliz. Na capital paulista, o Brigadeiro Luiz Antônio deixara como herança para o filho Francisco a Chácara da Consolação (extensa área que ia da Biblioteca Municipal à praça da República atuais) e para o filho Vicente, outra grande chácara, que hoje se estende da rua Riachuelo às ruas Humaitá e Santo Amaro.

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Observação 4. A literatura a que tive acesso não menciona qual escola superior Luiz de Queiroz cursou em Zurique. No “Souza Queiroz. Álbum de família” (Queiroz, 2007) lê-se: ”Na França, cursou a Escola de Agricultura e Veterinária de Grignon, e, posteriormente, a de Zurick, na Suíça alemã, mas quando a França e a Alemanha entraram em guerra, o pai determinou que ele (Luiz de Queiroz) e o irmão Francisco Vicente voltassem ao Brasil, interrompendo os estudos”. Tal afirmativa é parcialmente incorreta, pois não havia escola de agricultura em Zurique, como se entende ao se analisar a frase: “cursou a Escola de Grignon e a (aquela) de Zurick”. Além disso, Grignon tinha apenas curso de agricultura e não de agricultura e veterinária. Mesmos equívocos aparecem em Kiehl (1976) e em Marcovitch (2005).

Duas instituições tradicionais existiam em Zurique nos anos em que Luiz de Queiroz esteve na Europa (1857 a 1873): Universitas Turicensis (Universidade Turicensis) e Eidgenössische polytechnische Schule Zürich (Escola Politecnica Federal de Zurique). A Universidade Turicensis foi criada em 1833, administrada pelo Cantão de Zurique, reunindo os colégios de teologia, jurisprudência e medicina, e uma faculdade de artes, depois dividida em dois departamentos: de Artes (Filosofia, línguas e História) e de Matemática e Ciências Naturais. Em 1901, incorporou-se a ela (mantendo a autonomia) a Escola de Medicina Veterinária (criada em 1820). Em 1912, toda a estrutura acadêmica passa a ser Universidade de Zurique. A Escola Politecnica Federal de Zurique foi criada em 1855 pelo governo federal, sendo integrada por seis faculdades: arquitetura, engenharia civil, engenharai mecânica, química, silvicultura e um departamento para as áreas de matemática, ciências naturais, literatura e ciências políticas e sociais. Ponto interessante a considerar é que esta escola foi aceita como parte temporária da Universidade Turiscensis, e, quando o Edifício Politécnico da Escola Politécnica foi concluido em 1864, a Universidade Turiscensis passou a acupar a asa sul do prédio, mostrando, assim, estarem integradas. 

Não havia, pois, escola de agricultura em Zurique (apenas de medicina veterinária), o que não é novidade para um país situado nos Alpes, de agricultura sequer suficiente para a demanda do país. A inclinação de Luiz de Queiroz para a engenharia explica seus pionerismos, quer na implantação de uma tecelagem totalmente movida a energia elétrica, de origem hidráulica, como nos projetos de iluminação elétrica e de telefonia implantados em Piracicaba. Tais realidades sugerem ter ele cursado a Escola Politecnica Federal de Zurique, podendo não tê-la concluido, devido a morte do pai em 1872.

Os bairros de Campos Elíseos, Santa Cecília e Barra Funda foram criados em antigos terrenos pertencentes ao pai de Luiz de Queiroz, cuja atuação política iniciara-se no império de Dom Pedro II, tendo ele sido vereador na capital paulista, e seu irmão Francisco presidente (governador) da província de São Paulo.


Avenida Paulista em 1902, com seus palacetes. Fotografia do suíço-brasileiro Guilherme Gaensly.

O ano era 1873. Na mansão da família do Barão de Limeira, na cidade de São Paulo, Luiz de Queiroz é carinhosamente recebido pela mãe, a Baronesa de Limeira, e por seus irmãos, consternados ainda pela perda recente do pai. Dezesseis longos anos se passaram, vividos na Europa. Grande interesse havia na família, pois quem chegava trazia consigo uma formação diferente de todos os varões Souza Queiroz, advogados formados pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco ou médicos diplomados na Alemanha. O agora especialista em agricultura, retornava com o propósito de assumir as terras que lhe pertenciam. Para isso, quis saber como chegar à Constituição (Piracicaba) e onde se alojar na cidade. 

Luiz de Queiroz ouve, então, as explicações de que tinha necessidade saber. 

— O caminho é o mesmo por onde seguia o nosso pai, pois caminhos de ferro, como os da província do Rio de Janeiro, inexistem aqui em São Paulo — disse-lhe um dos irmãos. — 

Poderias ficar na fazenda de tia Ilídia — disse uma das irmãs. 

Percebendo em tempo o equívoco em que incorrera, ao querer adiantar-se à baronesa sua mãe, a quem cabia, de ora em diante, a chefia da família, acrescentou com humildade: 

— A senhora assim não acha, mamã? 

Tendo recebido a aprovação da progenitora, que com rápido gesto de cabeça indicara sua opinião favorável, prosseguiu ela: 

—Tia Ilídia é irmã de nosso defunto pai, que Deus o tenha!... A emoção embarga-lhe a voz; um lencinho de seda serve-lhe de contenção às lágrimas, que começavam a ofuscar-lhe a vista. Recompondo-se, continua ela: 

— A titia está bem velhinha agora, com 68 anos de idade, e, como sabes, ficou viúva do nosso nobre tio Estevão, que o Imperador Pedro I condecorou com o título de Marquês de Valença. Nós éramos crianças quando ele morreu.

Dias depois Luiz de Queiroz vem a Constituição e é hospedado na sede da fazenda que pertencia a seus tios, a marquesa Ilídia Mafalda de Souza Queiroz (irmã de seu pai) e Estevão Ribeiro de Resende (Marquês de Valença, falecido em 1856). Tendo mais de mil alqueires de terra, com predomínio da roxa, dos quais perto de 300 alqueires eram de exuberante mata, a fazenda se estendia por grande parte da margem esquerda do rio Piracicaba, cobrindo-a milhares de pés de café.

Certa ocasião, a Luiz de Queiroz foi apresentado, pela marquesa, o filho dela, Estevão Ribeiro de Souza Resende (futuro Barão de Resende), na época deputado provincial, homem dinâmico que tinha como objetivo fundar uma companhia de navegação nos rios Piracicaba e Tietê (o que aconteceria em 1878).

— Este é seu primo Luiz, de codinome “Lulu” — disse a marquesa, dirigindo-se ao filho. — Ele é o quinto rebento do meu irmão Vicente, falecido ano passado; chegou por estes dias, vindo da Europa, onde estudou na melhor das escolas agrícolas francesas...; vai ficar aqui na fazenda até que possa tomar posse da “Engenho d’Água”.

A conversa com o futuro dono do Engenho Central foi proveitosa, pois ambos tinham claro em seus propósitos a modernização de seus empreendimentos, mecanizando as operações para conseguir maior eficiência, sem a necessidade de muita mão de obra.

Luiz de Queiroz ia, aos poucos, conhecendo toda a família, de muitos casamentos de primos com primas, arranjados pelos pais para manter a riqueza e aumentar o poder político e o domínio social: Queiroz, Resende, Conceição, Costa Pinto.

Sede da fazenda Nazareth, concluída em 1880. Foto de autor não identificado (ref. Beatriz Elias).
Com o tempo passando, após a morte da marquesa em 1877, a fazenda em que fora hóspede passou à propriedade do piracicabano dr. João Batista da Rocha Conceição, filho de Francisco José da Conceição (Barão de Serra Negra, grande produtor de café, introdutor da cultura de algodão em Piracicaba) e irmão de Ana Cândida da Conceição (Baronesa de Resende). João Batista casara-se com Maria Nazareth da Costa Pinto Conceição, que era filha do Conselheiro Antônio da Costa Pinto e Maria Nazareth de Souza Queiroz Campeão, neta do Brigadeiro Luiz Antônio de Souza Queiroz. Em homenagem à esposa, a fazenda passa a se chamar Fazenda Nazareth, em 1880. Das múltiplas divisões havidas, muitas para fins imobiliários, dela restam 90 alqueires (Chácara Nazareth), com a antiga, belíssima e luxuosa casa sede, cuja construção foi concluída em 1880, em estilo que muito se diferenciava daquele de outras fazendas da região, construídas de taipa de mão, sem muito requinte.

Continua.

Referências.

DELFOUR, F. L’École d’agriculture de Grignon, de 1867 à 1918. Tese, 2000. 

ELIAS, B. Chácara Nazareth: uma história de poder desde o Império. Piracicaba. A Província, 2014. Ref. Memorial de Piracicaba. Almanaque 2002-03, Cecílio Elias Netto.

KIEHL, E. J. Vida e obra de Luiz de Queiroz. Esalq 75. Livro comemorativo do 75º aniversário da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”, p. 21-40, 1976.

MARCONDES, N. Chácara Nazareth. Piracicaba. A Província, 2015. Ref. Na trilha do passado paulista – Piracicaba Século XIX – Fazendas, Engenhos e Usinas.

MARCOVITCH, J. Pioneiros e empreendedores. A saga do desenvolvimento no Brasil. São Paulo, Edusp, v. 2, 2005.

PASCHOAL, A.D. História de uma família. Genealogia à luz da história Piracicaba,. Tomo II. Séculos XIX e XX. 403 p. 2010.

PERECIN, M.T.G. Os passos do saber. A Escola Agrícola Prática “Luiz de Queiroz”. São Paulo. Edusp, 2004.

PILOTTO, C.M.S.F; BREMER NETO, H. (Coord.) Luiz de Queiroz. Vida e Obra. Uma percepção humanística. Piracicaba. USP-Esalq, 2019.

QUEIROZ, L. R. S. Souza Queiroz. Dicionário de família. Editora de Direito, 2003.

QUEIROZ, L. R. S.; FAGUNDES JR, C. E. U. Souza Queiroz. Álbum de família. São Paulo. Associação Barão de Souza Queiroz de Proteção à Infância e à Juventude, 2007.

SANTIAGO, S. Presença da língua e da literatura francesa no Brasil. Niterói. Universidade Federal Fluminense. Conferência. ABL, 2009.